Veio Santa Alface a este mundo pr' acalmar nossos desassossegados estômagos. Seja feita a sua vontade. Amén

Monday, October 16, 2006

O nosso Reino (e ai dos outros que cá venham pedir esmolinhas)

Que vivemos num clube de golfe restrito, já todos tínhamos percebido («penso eu de que...»). Que fechámos a entrada da plebe neste nosso clube de elite, também todos têm noção.

A questão prende-se com o conceito de fronteiras, não é?

Afinal o que delimita um país ou, neste caso, um continente? Pior: um conceito abstracto de união idealística entre países de um continente estranhamente delimitado – por que é que Israel aparece no belo do festival da canção enquanto se colocam dúvidas existenciais sobre a delimitação da Europa aquando a eventual adesão da Turquia? (E não entremos por aí)

A visão deste ser que vos ousa dirigir a palavra é a seguinte:

1) Existem diversos territórios e nestes habitam muitas pessoas.

2) Ora, havendo muita gente, e não querendo ir directamente ao “tudo ao molho e fé lá no outro”, cada território tem (ou deveria) de ser administrado de forma a satisfazer as necessidades da população (numa de democratas, de TODA a população). Aqui entraria a bela da “Economia ao serviço do Homem” (hahaha…?), numa onda sustentável e em harmonia com o ambiente.

3) Para administrar esta malta – sobretudo, ao nível da produção, distribuição e consumo de bens e serviços – seriam necessários órgãos de poder (e não querendo entrar em extensivas descrições de como o acesso e o exercício a e deste poderiam ser democráticos, passemos ao ponto seguinte).

4) Da vida em colectividade surgiria a cultura, valores comuns e por aí fora.

5) E o estatuto de pertença à colectividade? A cidadania?

Ora bem, a cidadania, meus caros, tem-se (ter-se-ia) a partir do momento em que se vive numa colectividade, já que é nesta que construímos a nossa rede de interacções sociais (de trabalho, consumo, vizinhança, etc.), independentemente de se ter nascido lá longe, ou no outro lado da rua.

“Mas ah e tal, isso é estúpido.” Será? E porquê?

Porque cada “nação” tem a sua cultura, as suas tradições?! Então, caro leitor, vá à janela e abrace com força a bandeirinha do Scolari, esperneie e berre esse hino militarista, que isto aqui é nosso e fora com esses todos que nos querem roubar trabalho.

Aqui, na Caracolândia, vemos as coisas de forma diferente: a cultura é uma coisa dinâmica e, como tal, vive da constante renovação e do convergir de tudo o que entra em contacto com aquilo que, primariamente, já existia; a tradição é boa para o turista ver — tradição (ainda pra' mais reaccionária) porque sim, não é nada.

Posto isto, o único argumento eventualmente válido, quando regressamos à realidade, está intimamente ligado aos fluxos migratórios. Porque se a cidadania fosse um dado adquirido a partir do momento em que se vive num determinado local, este iria perdendo qualidade, a relva ficava amarela de tanto espezinhar e, possivelmente, o clube de golfe afundava.

Voltemos, então, ao abstracto por mais um pouco. Se TODOS os “locais” estivessem num patamar de igualdade, i.e., se em todo o Mundo se vivesse folgadamente, ignorando tretas como o determinismo geográfico¹, em plena utopia do desenvolvimento sustentável à escala mundial…. Upa upa!

Mas na realidade temos jogos de poder e sede de petróleo e perturbações psíquicas dos “nossos” líderes belicistas e… temos História e rancor e ódio e… Merda, muita merda².

Mas a pergunta é: que legitimidade temos nós, peito cheio de europeísmo e civilização, para nos enclausurarmos neste mundo idealmente (ou pelo menos nos panfletos da propaganda) perfeito, deixando quem não tem o que comer à porta? Que legitimidade temos nós, que à la neo-colonialistas os impedimos de se desenvolverem pelos seus próprios meios, para os deixarmos a morrer à porta?!

¹ ver: http://pt.wikipedia.org/wiki/Determinismo_geogr%C3%A1fico

² e o corrector do Word não reconhece “merda”… Hipócritas…

Nairobi

6 Comments:

Blogger Caracol Amarelo said...

Bom, vou ser o primeiro a comentar. Ihih. Mais ninguém deve ter coragem para ler isto, digo eu. És uma jovem cheia de preocuopações a nível económico-cultural. Mas há que contrapor-te aqui em um aspecto. Onde é que até hoje uma tal república das bananas sobreviveu? É a questão que o leitor quer saber. Acho que deve haver pessoas mais bem documentadas que nós os dois para falar acerca de uma população que se sustenta, e sustenta a população de igual forma, e, novamente, que toda a gente viva "encharcado de notas". Sinceramente? Eu acho impossível, mas eu caí numa certa descrença, logo não sou uma grande opinião. Quanto à tua ideia de população auto-sustentável, concordo em absoluto. Se houvesse uma certa igualdade geográfica na distribuição da riqueza, talvez isso ajuda-se a superar certos problemas como a xenofobia relativamente aos fluxos emigratórios, porque quer queiramos, ou não, as imigrações e emigrações são alvo de comentários racistas e/ou xenófobos.
Mas, atenção, o mundo está cheio de campos de golfe no meio de savanas. Há sempre quem se aproveite dos outros. E, por mais triste que seja, nós os portuguesitos temos meia dúzia de florestas de Quercus, no meio dos quais existem uns campos de golfe com relva amarela.

1:49 AM  
Blogger Caracol Amarelo said...

ah mais uma vez o gajo esqueceu-se de assinar.

Multifasciatus

1:50 AM  
Blogger João Dias said...

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10:54 AM  
Blogger João Dias said...

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10:57 AM  
Blogger João Dias said...

"...vemos as coisas de forma diferente: a cultura é uma coisa dinâmica e, como tal, vive da constante renovação e do convergir de tudo o que entra em contacto com aquilo que, primariamente, já existia; a tradição é boa para o turista ver — tradição (ainda pra' mais reaccionária) porque sim, não é nada."

Subscrevo e elogio estas palavras, quer pela escrita quer pelo conteúdo.

Convém salientar que as fronteiras não "fecham e abrem", apenas discutimos se devemos dar condições legais a quem procura um melhor nível de vida? A mim parece-me óbvio que sim, isto porque em contrário assumimos um papel (de forma consciente ou não) complacente com a exploração laboral de imigrantes ilegais, com as máfias e com a criminalidade em geral. Não é a legalização de imigrantes que gera criminalidade é precisamente o aceitar desta barbaridade de ausência de direitos que gera focos de criminalidade.

O imigrante é alguém que já pensou para onde ir, quantos imigrantes fogem de um país melhor para um pior sem que seja pelo salvaguardar da própria vida?
Ou seja os imigrantes não vão para sítios onde não haja emprego, e não confundamos taxas de desemprego com ausência de emprego, o desemprego está também associado à precaridade dos empregos. Os imigrantes que vêm para Portugal sabem perfeitamente que vem para ser explorados, e isso não levantará a questão essencial de nos perguntarmos que raio de vida têm estes tipos para se sujeitarem a isso?
Mais uma vez a questão leva-nos à equidade, se houvesse equidade estes fluxos não se verificariam, poucos brasileiros abandonariam o Brasil se tivessem lá alguma estabilidade. A imigração pode ser um factor bastante positivo (se exercido legalmente) no combate aos regimes ditatoriais, repare-se que o êxodo de pessoas que abandonassem um regime ditatorial era um golpe duro para esse mesmo regime. Mas nós somos complacentes, gostamos de incriminar nas palavras mas somos benevolentes na acção.





Multifasciatus:
Não conheço "repúblicas das bananas" que tenham colapsado por causa da imigração...

11:02 AM  
Blogger Caracol Amarelo said...

Acho que não perceberam exactamente a minha questão. Quando falo de repúblicas das bananas refiro-me ao facto da auto-sustentabilidade.

"Acho que deve haver pessoas mais bem documentadas que nós os dois para falar acerca de uma população que se sustenta, e sustenta a população de igual forma, e, novamente, que toda a gente viva "encharcado de notas""

Não digo que as repúblicas colapsam por causa da emigração e/ou imigração.
É a isto que me refiro a "república das bananas".

P.S. Tou quase de volta!

multifasciatus

3:27 PM  

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